O islamismo e o cristianismo são as duas religiões de maior porte e mais
missionárias do mundo. Suas crenças são semelhantes em muitos aspectos. Ambas
são monoteístas, foram fundados por um indivíduo específico em um contexto
definido e historicamente verificável. São universais e crêem na existência de
anjos, do céu, do inferno e de uma ressurreição futura. E mais: que Deus se fez
conhecer ao homem por meio de uma revelação. Entretanto, existem também
diferenças óbvias entre elas, particularmente em relação à pessoa de Jesus, ao
caminho de salvação e à escritura ou escrituras de fé. Essas diferenças abarcam
as doutrinas mais fundamentais de cada religião. Assim, mesmo que o islamismo e
o cristianismo tenham alguns pontos em comum, não podem haver duas verdades
quando uma não concorda com a outra.
O islamismo, assim como o
cristianismo, acredita que a fé de uma pessoa deve ser razoável tanto quanto
subjetiva, uma vez que devemos adorar a Deus com a mente e o coração. Ao
compartilharmos dessa mesma base com os muçulmanos, podemos examinar por que
eles crêem no que crêem. Nossa tarefa é analisar a apologética de cada religião
ou a defesa de sua fé para ver se as declarações de cada uma delas são
verificáveis. Daremos uma atenção especial à escritura ou escrituras de cada fé.
A razão para isso deve ser evidente por si mesma: é muito fácil alguém fazer
declarações a respeito de si mesmo, mas prová-las é um assunto totalmente
diferente.
A escritura sagrada do islamismo: o Alcorão
A
fonte de autoridade mais respeitada do islamismo é o Alcorão. Para os
muçulmanos, esta é a palavra pura de Deus, sem nenhuma mistura de pensamento ou
teor humano. De fato, muitos muçulmanos possuem um zelo tão intenso pelo Alcorão
que ficam ressentidos profundamente se um não-muçulmano não o possui. O termo
“corão” vem de “uma palavra árabe que significa ‘leitura’ ou ‘recitação’” 1. Os
muçulmanos afirmam que o Alcorão foi dado a Maomé em língua árabe, parte por
parte, durante um espaço de tempo de 23 anos até a sua morte (Suras 17.106;
43.3; 44.58). A apologética muçulmana do Alcorão cobre quatro áreas principais:
sua preservação, eloqüência, profecias alegadas e compatibilidade com a ciência
moderna.Verificaremos uma por uma.
1. A afirmação islâmica da preservação
do Alcorão
Referindo-se à autenticidade presente do Alcorão, Maulvi
Muhammad Ali faz a grandiosa declaração: “No que tange à autenticidade do
Alcorão, eu não preciso deter o leitor por muito tempo. De um extremo do mundo
ao outro, da China no Extremo Oriente a Marrocos e Argélia no Ocidente, das
ilhas dispersar do Oceano Pacífico ao grande deserto da África, o Alcorão é um,
e nenhuma cópia que difira sequer num ponto diacrítico pode ser encontrada em
posse de um dos 400 milhões de muçulmanos” 2. “Há, e sempre houve, seitas
rivais, mas o mesmo Alcorão é a posse de um e de todos... Um manuscrito com a
mais leve variação no texto é desconhecida” 3.
Assim, os muçulmanos não
apenas acreditam que o Alcorão seja a Palavra de Deus, mas também estão seguros
de que nenhum erro, alteração ou variação tocou-o desde seu começo. Logo, esta é
uma de suas “provas” de que o Alcorão é um milagre de Deus.
Resposta
cristã à preservação do Alcorão
Mohammad Marmaduke Pickthall, em “The
Meaning of The Glorious Koran”, diz-nos que na época da morte de Maomé as
suratas (ou capítulos) do Alcorão ainda não haviam sido compiladas. Isto foi
completado apenas durante o califado de Abu Bakr 1. O segundo Califa, Omar,
“subseqüentemente fez um único volume (mus-haf) que ele preservou e deu na
ocasião de sua morte à sua filha Hafsa, a viúva do Profeta”2. Finalmente, sob o
califado de Uthman, ordenou-se que todas as cópias do Alcorão fossem trazidas e
qualquer uma que divergisse do texto de Otman foi queimada.
Não
discutimos a posição islâmica de que desde a revisão de Otman o Alcorão
permaneceu intacto. Entretanto, por causa da destruição de todas as cópias
discordantes ninguém pode saber com certeza se o Alcorão como temos é exatamente
o mesmo que Maomé os entregou. O islamismo ensina que a única razão pela qual
Otman queimou todas as outras coletâneas do Alcorão era porque haviam variações
dialéticas de somenos importância nos diferentes textos. Entretanto, há algumas
evidências que tendem a refutar isto.
Em primeiro lugar, é muito
significativo que os “Qurra”, os muçulmanos que memorizaram o Alcorão completo,
foram contrariados veementemente pela revisão. Em segundo, os xiitas, segunda
maior seita no mundo islâmico, declaram que o Califa Otman eliminou
intencionalmente muitas passagens do Alcorão que se relacionavam a Ali e à
sucessão da liderança que ocorreria depois da morte de Maomé.
L. Bevan
Jones, em sua obra “The People of the Mosque”, responde sucintamente o argumento
muçulmano para a suposta preservação miraculosa do Alcorão: “Mas conquanto possa
ser verdade que nenhuma outra obra tenha permanecido por doze séculos com um
texto tão puro, é igualmente provável verdade que nenhum outro tenha sofrido
tamanho expurgo” 3.
Uma segunda asserção que fazem para provar a origem
sobrenatural do Alcorão encontra-se na Sura (capítulo) 17.88, que diz: “ainda
que os homens e os djins (gênios) se reúnam para produzir um Alcorão, jamais o
conseguirão, nem mesmo ajudando-se uns aos outros”. Usando este texto dizem que
a sua beleza e eloqüência são provas auto-suficientes de que seu autor é Deus.
Em uma nota de rodapé na sua tradução do Alcorão, Yusuf Ali declara: “nenhuma
composição humana poderia conter a beleza, poder e discernimento espiritual do
Alcorão” 4.
Entretanto, os muçulmanos não acreditam que o Alcorão seja um
milagre somente por causa de sua eloqüência e beleza, mas também porque a sura
7.157 refere-se a Maomé como “o profeta iletrado”. Acreditando que ele era
analfabeto, eles perguntam como tal homem poderia produzir o Alcorão.
Uma
declaração final a respeito da realização literária do Alcorão é que ele é tão
coerente do começo ao fim que nenhum homem poderia tê-lo arquitetado. Suzanne
Haneef pergunta: “Como o Alcorão inteiro poderia ser tão completamente coerente”
se não se originou de Deus” 5.
Resposta cristã à eloqüência do
Alcorão
A respeito da beleza, estilo e eloqüência do Alcorão, qualquer
leitor imparcial teria de admitir que certamente isso é verdade na maior parte
dele. Entretanto, a eloqüência por si mesma é dificilmente um teste lógico para
a inspiração. Se esse fosse o critério utilizado para julgar uma obra, então
teríamos de dizer que os autores de muitas das grandes obras da antiguidade
foram inspirados por Deus. Homero teria de haver sido um profeta para produzir a
magnífica Ilíada e a Odisséia. Na língua inglesa, Shakespeare é ímpar como
dramaturgo. Mas seria um absurdo que por causa disso disséssemos que suas
tragédias tiveram inspiração divina. O mesmo poderia ser dito em relação à
eloqüência do Alcorão.
Mas, e a respeito da coerência do Alcorão? Pode
ser utilizada para demonstrar que esta escritura muçulmana foi inspirada? Para
começar, pode-se mostrar que o Alcorão não é totalmente coerente, mas ao
contrário, possui contradições de vulto nele 6. E ainda que consentíssemos com a
tese de que o Alcorão é totalmente concorde, isto ainda não provaria coisa
nenhuma. Em um ensaio intitulado “How Muslims Do Apologetics”, o dr. John
Warwick Montgomery demonstra isto para nós: “Esta apologética é também de pouco
efeito porque a coerência de um escrito não prova que seja uma revelação divina.
A geometria de Euclides, por exemplo, não se contraria a si mesma em nenhum
ponto, mas ninguém afirma que por isso essa é uma obra divinamente inspirada em
algum sentido excepcional” 7
E, por fim, o que dizer a respeito do
suposto analfabetismo de Maomé? Antes de qualquer coisa, há bastante evidência
contra isso. Mas ainda que aceitássemos o fato de que Maomé não podia ler nem
escrever, isso não faria o Alcorão miraculoso. Por quê? Porque todos os
muçulmanos sabem que ele deveria ter pelo menos vários amanuenses ou escribas e,
portanto, ele poderia facilmente ter composto o Alcorão dessa forma, o que não
seria excepcional, pois há precedentes para isso. Um exemplo que seria familiar
à maioria das pessoas diz respeito a Homero. Ele era cego e, com toda
probabilidade, não podia escrever. Ainda assim ele foi o autor da Ilíada e da
Odisséia, os dois maiores épicos do mundo antigo. Da mesma maneira, se Maomé era
ou não realmente analfabeto não tem relação com o caso em questão.
3. A
afirmação islâmica sobre as profecias do Alcorão
O Alcorão fala muito
pouco profeticamente, se de fato ele profetiza. Daí, poucos apologistas
muçulmanos utilizarem a “profecia cumprida” como prova de sua fé. Entretanto, há
uma série de versículos no Alcorão que prometem que os muçulmanos serão
vitoriosos tanto em seu próprio país como no exterior8. Maulana Muhammad Ali
discute estas profecias detalhadamente em sua obra “The Religon of Islam”: “...
nós encontramos profecia após profecia publicada nos termos mais seguros e
certos no sentido de que as grandes forças de oposição seriam arruinadas... que
o islamismo se espalharia para os cantos mais longínquos da terra e que seria
finalmente triunfante sobre todas as religiões do mundo”9.
Resposta
cristã às profecias do Alcorão
Podemos dizer que a vasta expansão do
islamismo, predita por Maomé, é o cumprimento de alguma profecia? Se pensarmos
nisto por um momento creio que podemos facilmente responder não. Para começar,
um líder prometendo uma vitória às suas tropas ou seguidores no mínimo não é nem
um pouco excepcional. Todo comandante ou general o faz a fim de inspirar seu
exército e levantar o seu ânimo. Se, então, eles, os seguidores, são vitoriosos,
ele, o líder, é vindicado; se os seguidores perdem, então deixamos de ouvir as
promessas do líder, porque elas, junto com o movimento, são esquecidas. Além
disso, os muçulmanos tinham vários incentivos importantes para considerar
enquanto lutavam para promover a causa do islamismo. Se morressem, seriam
admitidos no paraíso: “Os que crêem e praticam o bem, conduzi-los-emos para
jardins onde correm os rios, e lá permanecerão para todo o sempre, e lá terão
esposas imaculadas, e lá desfrutarão de uma sombra densa” (Sura 4.57). E ainda:
“naquele dia os moradores do Paraíso em nada pensarão a não ser na sua
felicidade. Junto com suas esposas, reclinar-se-ão sob arvoredos sombreados em
sofás macios” (Sura 36.55,56). Além disso, se continuassem vivos e fossem
vitoriosos na batalha, os soldados muçulmanos poderiam dividir quatro quintos do
despojo.
Há outra razão para que o islamismo se expandisse tão
rapidamente no início. Se olharmos para algumas das imposições do Alcorão a
respeito do que os incrédulos poderiam esperar das mãos dos muçulmanos, fica
fácil entender porque tantos “submeteram-se”, como encontramos na Surata 5.33:
“O castigo dos que fazem a guerra a Deus e a Seu Mensageiro e semeiam corrupção
na terra é serem mortos ou crucificados ou terem as mãos e os pés decepados,
alternadamente, ou serem exilados do país: uma desonra neste mundo e um suplício
Além” 10. Os politeístas tinham duas escolhas: submissão ou morte. Os cristãos e
os judeus tinham uma terceira alternativa: pagar pesados tributos (Sura
9.5,29).
Um último ponto a ser considerado: se o crescimento rápido e
amplo de um movimento indicasse o favor divino, então o que diríamos de
conquistadores como Genghis Khan? Ele consolidou as tribos mongóis e, em um
espaço de tempo mais curto do que o do islamismo antigo, conquistou uma área
geográfica muito maior. Seu sucesso militar evidenciaria que ele era dirigido
por Deus? E o que dizer a respeito do próprio crescimento do islamismo, freado
no Ocidente por Carlos Martel (a.D.732) e no Oriente, por Leão III (a.D.740)?
Significaria que eles haviam perdido o favor de Alá. E sobre a história
posterior de muitas nações islâmicas que sofreram o ultraje de se tornarem
colônias das então potências mundiais? Não, não podemos encontrar nada
misterioso ou sobrenatural sobre o surpreendente crescimento primitivo do
islamismo e sua subseqüente queda.
4. A afirmação islâmica sobre a
ciência e o Alcorão
Finalmente, existe uma obra, “A Bíblia, o Alcorão e a
Ciência”, escrita por um cirurgião francês chamado Maurice Bucaille que tenta
demonstrar a origem divina do Alcorão ao revelar sua supostamente notável
afinidade com a ciência moderna. Depois de citar alguns exemplos, Bucaille
conclui que: “...levarão a julgar inconcebível que um homem, vivendo no século
VII da era cristã, pudesse, sobre os assuntos mais diversos, emitir no Alcorão
idéias que não são só de sua época, e que concordarão com o que se demonstrará
séculos mais tarde. Para mim, não existe explicação humana para o Alcorão”
11.
Resposta cristã à ciência e ao Alcorão
Ao responder Bucaille
devemos primeiro salientar que a maior parte do livro não trata do Alcorão e da
ciência. Em contrário, sua maior parte é uma tentativa (utilizando-se das
técnicas de autocrítica) de desacreditar a Bíblia. As porções de seu livro que
tentam mostrar que o Alcorão está em concordância surpreendente com o
conhecimento científico são muito vagas. Mas, e se nós concordássemos com sua
tese de que as afirmações do Alcorão estão em total harmonia com a ciência
moderna? Bucaille declara que se isto fosse verdade então “esta última
constatação torna inaceitável a hipótese daqueles que vêem em Mohammad o autor
do Alcorão” 12.
Concordo com sua conclusão e suponho que sua tese seja
verdadeira. Se o Alcorão contém afirmações científicas detalhadas, descobertas
recentemente como sendo verdadeiras, e se foram escritas no sétimo século a.D.,
então poderia não ser simplesmente produção de Maomé. Mas isto não indica a
fonte de informação, apenas demonstra que nenhum ser humano poderia tê-lo
escrito sem a ajuda sobre-humana.
Se de fato o Alcorão teve uma origem
sobrenatural, ainda somos deixados com a tarefa de encontrar quem foi essa
fonte. Bucaille presume que foi Deus. Por quê? Se pararmos e pensarmos um
momento, perceberemos que há outros seres sobrenaturais além de Deus. Um destes
seres é conhecido na Bíblia como Satanás, assim como no Alcorão. A Bíblia nos
diz que ele está na terra há tanto tempo quanto o homem, tem poder e
inteligência muito superiores aos nossos e é o “pai da mentira” (Jo 8.44).
Sussurrar alguns fatos científicos nos ouvidos de alguém não seria uma grande
proeza para ele. Para dizer a verdade, a Bíblia diz que ele aparece aos homens
de tempos em tempos: “porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz”
(2Co 11.14).
É interessante que este tenha sido exatamente o temor
inicial que Maomé sentiu a primeira vez em que a voz lhe falou.
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